O aprimoramento interior é um trabalho lento, perseverante e árduo. Tarefa única de o próprio ser que, na labuta diária, nas incontáveis alfinetadas, imperceptíveis aos olhos alheios, mas sentida por quem recebe, traz a instrumentação refinada de impulsionar a transformação interior. Muitas vezes essa transformação é dolorosa, com chagas abertas, sangrantes, lágrimas doridas, migalhas de felicidades, mas para quem aspira a doce e serena paz da madureza espiritual; de quem já galgou os picos às custas de muitos sacrifícios e renúncias é mais desejosa a subida sacrificial do que a inquietude dos vales com suas armadilhas e surpresas a cada esquina, a cada depressão e elevação.
Irmão X ( Francisco C. Xavier) nos conta no livro: Contos desta e doutra vida- uma narrativa muito interessante que retrata a renúncia a serviço da elevação.
“Quando João Rigueira partiu da terra, ardia ele no ideal de fazer o bem. Espírito prestimoso, não adquirira, no entanto, merecimento para grandes alturas. Era preciso trabalhar mais, estudar mais...
Nicésio o benfeitor que o tutelara foi claro na lei de merecimento.
- João, você, para elevar-se, precisa mais tempo entre os homens.
- Para quê?- indagou surpreso, o recém chegado, que aspirava aos cimos.
- A fim de aprimorar-se, através do serviço em nome de Jesus. Além disso, você deixou no mundo a filha pequenina. Rosalva precisará de você...
João se lembrou da filha pequenina que a esposa abandonara. Antes de deixar o corpo físico, entregara-a aos cuidados de pobre amigo que se prontificou interná-la em humilde orfanato”.
Nicésio o aconselhou a ser forte para ajudar a criança e a si mesmo, trabalhar junto a grupo familiar repartindo forças e atenções.
Assim começou como verdadeiro guardião, a auxiliar em casa do Dr.Vicentino de Freitas, com abnegação e desvelo. Amigo espiritual visível aos olhos espirituais de Dona Guiomar, a esposa, se desdobrava em assistência na luta íntima de cada membro. Inspirava-os, dava passes magnéticos em todos, pagem vigilante, atalaia incansável, enfermagem e auxílio nas doenças da família. Bálsamo invisível, dileto amigo.
Rosalva por sua vez, aos 14 anos, despedira-se do orfanato para servir de copeira na casa de família abastada.
João começou a acompanhar o sofrimento da filha perseguida pelo primogênito da casa, que com o passar dos anos apertava mais o cerco. Rosalva atormentada se via na trama dos pensamentos inferiores. Aos vinte anos, desfigurada e abatida envolvida pelas sugestões paternas, pôs-se a deambular, rua a fora, acompanhada de perto por João que entusiasmado a conduzia com otimismo e ternura ao lar do Dr. Vicentino de Freitas.
Naquele exato momento a família iria iniciar o evangelho, quando a jovem tocou a campainha.
Inspirada por Rigueira falou: Via-se abandonada, pedia trabalho honesto, era órfã sozinha... O Dr. Vicentino rispidamente disse que não precisava de empregada. Dona Guiomar retrucou que não dispunha de possibilidades para examinar a proposta. Dona Clélia ( cunhada) mais generosa deu-lhe vinte cruzeiros para o lanche, recomendando-lhe ir à casa vizinha , onde precisavam de cozinheira.
Rosalva retirou-se em lágrimas e ainda ouviu do portão dona Guiomar:
- Deve ser uma perdida qualquer...
Dona Clélia acrescentou com sarcasmo:
- De moça que se oferece, Deus nos livre!
Iniciada a prece, lido e comentado trecho sobre a beneficência. Através da mediunidade de Dona Guiomar, João o amigo espiritual está pronto para o serviço de passe curativo. Como nunca acontecera no curso de vinte anos, o benfeitor guardava silêncio, mostrando sinais de imensa amargura.
- Que houve irmão João? – Você triste? – perguntou o Dr. Vicentino.
Rigueira, porém desapontado respondeu:
Não se preocupe meu amigo. Tudo vai bem.
E concluiu:
- Continuemos trabalhando... Em nome de Jesus”.
Refletindo nesta lição, nos questionamos: até que ponto está nossa capacidade de renúncia? De suportar os maus tratos aos nossos entes queridos, ou a nós mesmos? E continuarmos firmes e perseverantes, em nome de Jesus, no serviço do Bem!
Para quem busca melhoria interior, é sempre oportuno lembrar-se das Bem Aventuranças do sermão da montanha.